O advento dos grande sistemas de monitoramento de dados, os chamados BigData, elevaram as pesquisas como ferramentas para identificação do comportamento das pessoas a um patamar elevadíssimo. É como um círculo que liga a ultramassificação com a ultra individualização do cidadão, do consumidor, do eleitor ou de qualquer outro foco humano de investigação. A digitalização do sistema de busca de informações (antes feito por pesquisas de campo, telefone, relatórios de vendas, etc.) pode acrescer um novo D, de Digital à nossa visão de pesquisas em 3D desenvolvida nos artigos anteriores.
Com estes dados, a segurança e a insegurança passaram a andar de mão dadas no ambiente das pesquisas num patamar inédito. Instituições, empresas, meios de comunicação passaram a ter uma grande garantia de como dialogar o mais individualizado possível com seu público de interesse, não como manifestação de proximidade, de intimidade, mas, de massificação da individualidade. Mega dados e grandes agrupamentos de dados, gerando, por meio de inteligência artificial, informações ultra personalizadas. Para o individuo, um universo de ofertas de produtos, serviços, oportunidades, informações seletivas, como jamais visto.
Por outro lado, as pessoas passaram a ter também sua individualidade acessada tanto de maneira maciça (por infinitos meios cookieados), como numa espantosa revelação não autorizada de sua intimidade e sua privacidade, mesmo quando clicam a caixinha permitindo o uso dos seus dados. Na verdade, elas jamais terão a real dimensão do que será feito com eles diante da velocidade alucinante com que estas ferramentas evoluem, isto se nos mantivermos no universo minimamente ético.
Como toda criação humana, estes sistemas tem seus lados positivos e negativos. Mais confiança nas informações, mais conhecimento da diversidade de interesses, mais possibilidades de atender desejos e necessidades específicas por um lado e mais exposição indesejada, invasão de privacidade, acesso não autorizado, manipulação, de outro.
Do ponto de vista corporativo ou institucional é uma ferramenta de excepcional funcionalidade, eficiência e eficácia, ainda mais se combinada com a capacidade analítica e de desenvolvimento de estratégias que estes dados permitem. Do ponto de vista individual, eles oferecem uma capacidade de personalização do atendimento das necessidades dos públicos alvos, como só existiu, aproximadamente, no auge dos grandes agrupamentos de artesãos na Europa ocidental. Só que agora falamos de bilhões de seres e não apenas de algumas centenas de pessoas em volta de cada guilda daquelas.
Como é uma realidade incontornável e será cada vez mais presente nas nossas vidas, cientes ou não desta presença, tendo autorizado ou não o acesso aos seus dados, a pergunta que fica é: como minimizar os danos de algo tão poderoso assim?
A primeira perspectiva que aventamos é a necessidade de que a regulação e regulamentação do uso destas ferramentas avance o mais rápido possível e com flexibilidade para acompanhar as inovações que são agregadas a cada instante. A legislação sobre o acesso à informação e o direito à privacidade face a estes gigantes dos dados é o primeiro e mais importante desafio. O pioneirismo da legislação europeia, já estimulando outros países, como o Brasil já o fez, a adotarem suas leis sobre o tema é um passo importante.
A institucionalização democrática da regulação desta atividade com consulta pública, participação dos diversos atores, proteção à pressão econômica, é fundamental para reduzir danos, melhorar a qualidade do que é minerado e permitir a evolução tecnológica dentro dos limites do Estado de Direito.
Mas, há uma outra face disto, que diz respeito aos atores, especificamente. Proprietários destes sistemas, clientes, trabalhadores, cientistas, planejadores, desenvolvedores e outros envolvidos na sua realização, seja no dia a dia, seja no longo prazo, precisam, para além da regulação institucional, ter os autolimites das ferramentas bem definidas para que mais um avanço tecnológico não se torne um desserviço à humanidade.
Além dos compromissos e padrões éticos, morais e de respeito legal e ao direito individual, que devem reger as atividades vinculadas ao sistema BigData, há um aspecto muitas vezes menosprezado ou mesmo ignorado em sua execução que é a capacidade analítica dos seus dados. A montanha de informações gerada por eles não é e não deve ser minerada apenas em termos quantitativos e não devem ser visto apenas como estatística. O conteúdo que elas geram, a subjetividade, são tão importantes quanto os números e as estatísticas.
As informações, estratégias, planos, táticas, ações que surgem destes dados podem ter os mesmos efeitos na sociedade que os meios para a obtenção deles, sejam eles positivos em termos de valores humanos, sejam eles negativos sob os vários aspectos já citados neste artigo. E isto não diz respeito apenas àqueles que trabalham o pós-dado, analisam os relatórios, etc. Diz respeito também a quem coleta e minera os dados e produz o relatório “bruto” dos dados colhidos.
Coleta de dados, mineração e conteúdo, são faces de um triângulo que deve ser o mais harmonioso possível, tendo como referência os valores mais nobres que regem a atividade humana Enfim, os desafios são tão Big quanto os dados que existem hoje espalhados pelo mundo.